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29 setembro 2014

josé alberto oliveira / a gata de beethoven



Entrada a noite,
a gata Electra
esquece vinganças
e senta-se
ao meu lado.
Ouvimos os trios de cordas,
eu bebo whisky
a bem da morte sóbria
ou, pelo menos,
de um sono conforme;
a via parece suave,
a pulsação
quase perfeita
e a gata pensa
que não há direito
que alguém sofra.



josé alberto oliveira
resumo a poesia em 2011
assírio & alvim
2012




16 agosto 2012

josé alberto oliveira / lema





Depois alguém morreu;
a estada tornou-se penosa,
o verão parecia não ter fim.
Era tempo de fazer malas
e projectos, de trocar
pautas por desacertos,
como, no último trimestre
do liceu, quem se apaixona
e arrepende da solidão que perdeu.
Assim chegou o outono
─  depois alguém morreu.




josé alberto oliveira
resumo a poesia em 2011
assírio & alvim
2012





22 maio 2009

josé alberto oliveira / elogio da solidão








Uma casa para estrear e descobrir
em quantas salas se acomoda a solidão.
Cozinhou o jantar e come atentamente
como todos quantos dividem a comida em silêncio:
o náufrago, o mendigo, o oleiro na lancheira.

Coze o seu barro, um jeito de partir o pão
que deve ao tempo uma lentidão coalhada.
O ruído do vizinho não o incomoda.
Nenhuma fala ou resíduo humano leveda
uma página ao acaso. Pode decidir beber mais vinho
ou inaugurar a leitura de outro livro.
Mesmo sair para beber café e mastigar o frio.

No pasto, a chuva rega a placidez do boi;
abana a cabeça, fumegam as narinas,
desenha-se num fundo de pinhal que o vento
castiga; na caruma molhada pressente-se
o rumor de um cão absorto na ilusão
do que procura. Coisas mínimas, irrisórias,
vão salvar o resto da noite de presumir felicidade.

Lá fora a cidade está cercada na convicção
das suas vidas perdoáveis, mercando
um alimento longamente dispensável
- a respiração em vitualhas e sarcasmos,
a pobreza irresignável e irresolúvel,
o cansaço de não estar só e não querer estar.









josé alberto de oliveira
por alguns dias
assírio & alvim
1992