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14 novembro 2023

benjamin péret / pobre trigo

  
O rei dizia ao seu povo
Que cada um pouse um pé no chão
e espere que o outro floresça
E dos pés esticados saíram espigas
belas como um relógio que se engana nas horas
Baloiçavam à cadência dos suspiros do rei
Como um navio antigo
e as suas cabeças entrechocavam-se
com um barulho de esqueleto a descer as escadas de pedra
 
Então considerando que o seu povo estava maduro como um
                                                                             general
o rei ergueu-se no seu trono
esbofeteou a rainha
e sacando da gadanha seu emblema
e picou o seu povo tão picadinho
que o vento levou para sempre
uma nuvem de poeira branca
 
 
 
benjamin péret
sol de bolso
uma antologia de poemas
trad. regina guimarães
contracapa
2023




 

03 setembro 2023

benjamin péret / a floresta bébeda

 
 
Uma árvore abatida para ti será
também duas
e a floresta igualmente
pois que uma fonte brota do meu joelho
levando-me o machado para outros continentes
 
Uma árvores abatida para ti será
Quer chova neve ou sopre vento
usa-a ao pescoço
para que a tua vida seja quente como brasa
 
Oxalá o meu machado refloresça na sua floresta natal
ou erre qual velho náufrago
ao sabor das mortes súbitas
uma árvore abatida para ti será
 
 
 
benjamin péret
sol de bolso
uma antologia de poemas
trad. regina guimarães
contracapa
2023
 



05 junho 2023

benjamin péret / melancólica sala da caldeira

 



 
Sonho com todas as estrelas
e elas fazem o mesmo
Não há tempo a perder
tudo isto vai rebentar
Estamos perdidos
estamos perclusos
Suspirar ou olhar
nem nem já não sonho e vou-me embora
Não estamos perdidos
 
 
 
benjamin péret
sol de bolso
uma antologia de poemas
trad. regina guimarães
contracapa
2023




23 abril 2021

benjamin péret / onde está ele

 
 
Onde está ele
Entre as estrelas agachadas
ou os minerais desconhecidos
que ardem nas corolas das flores fatais
Se eu sonhasse poderia responder
Ele desce do bico da pomba
ou então
Ele sobe a escadaria de neve que leva às rochas suspirantes
a grande escadaria benévola
onde vivem os poetas de borracha
 
 
 
benjamin péret
sonhador definitivo e perpétua insónia
uma antologia de poemas
surrealistas escritos em língua francesa
trad. regina guimarães
contracapa
2021






15 junho 2013

benjamin péret / tempo diferente



O sol da minha cabeça é de todas as cores.
É ele que ilumina as casas
de palha
onde vivem os senhores saídos das crateras
e as belas mulheres que em cada dia nascem
e em cada tarde morrem
como os mosquitos.
Mosquito de todas as cores
que vens tu fazer aqui?
O sol este sol é para cães
e o calor sacode as montanhas
enquanto as montanhas nadam
sobre um mar pleno de luzes
onde o calor e o peso da vida
não existem
onde eu não meteria nem a ponta do meu pé.



benjamin péret
(frança, 1899-1959)
tradução de nicolau saião



24 junho 2012

benjamin péret / a doença imaginária


  


Eu sou o cabelo de chumbo
que viaja de astro em astro
que se tornará em cometa
e num ano e num dia te destruirá.

Mas por enquanto não há dias nem anos
existe apenas uma planta viçosa
de que desejas ser semelhante

Para ser irmão das plantas
é preciso crescer na vida
ser sólido quando na morte
Ora eu sou somente imóvel
e mudo como um planeta
Vou banhando os pés nas nuvens
que como bocas em volta
me condenam a ficar
entre os que parados estão
e que as plantas desesperam

No entanto um dia
os líquidos revoltados
lançarão para as nuvens
armas assassinas
manejadas pelas mulheres azuis
como os olhos das filhas do norte

E esse dia será dentro de um ano e um dia.




benjamin péret
tradução de nicolau saião





22 abril 2012

benjamin péret / a desonra dos poetas



  
[…] O poeta luta contra toda a espécie de opressão: em primeiro lugar a do homem pelo homem e a opressão do seu pensamento pelos dogmas religiosos, filosóficos ou sociais. Ele luta para que o homem atinja definitivamente um conhecimento perfectível de si próprio e do Universo. Não se conclua disto que o poeta deseja pôr a sua poesia ao serviço de uma acção política, mesmo revolucionária. Mas a sua qualidade de poeta faz dele um revolucionário que deve combater em todos os terrenos: no da poesia pelos meios que a esta são idóneos e no terreno da acção social sem jamais confundir os dois campos de acção, sob pena de estabelecer a confusão que importa dissipar e, por conseguinte, de deixar de ser poeta, isto é, revolucionário.




benjamin péret
a desonra dos poetas
o surrealismo na poesia portuguesa
org. de natália correia
frenesi
2002