28 novembro 2016

sylvia plath / carta em novembro



Amor, o mundo
De repente muda, muda de cor. A luz da rua
Perpassa por entre as vagens do laburno
Que lembram a cauda dos ratos, às nove da manhã.
É o Árctico.

Este pequeno círculo
Negro, com estas trigueiras e sedosas ervas – cabelo de bebé.
Há uma cor verde no ar,
Suave, voluptuosa,
Conforta-me com amor.

Estou corada e quente.
Se calhar isto é absurdo,
Sou tão estupidamente feliz,
As minhas galochas
Dão passos ruidosos, atravessam o vermelho maravilhoso.

É a minha propriedade.
Duas vezes ao dia percorro-a, cheirando-lhe
O bárbaro azevinho em conchas
De verdete, ferro puro,

E a parede de velhos cadáveres.
Amo-os.
Amo-os como à história.
As maçãs são douradas,
Imagine-se –
As minhas setenta árvores
A prender as suas bagas vermelho-douradas
Num espesso e mortal caldo cinzento,
Com um milhão
De folhas de metal douradas e sem vida.

Ó amor, Ó celibato.
Mais ninguém senão eu
Caminha com água pela cintura.
As insubstituíveis
Riquezas sangram e afundam-se, as bocas das Termópilas.



sylvia plath
ariel
trad. maria fernanda borges
relógio d´ água
1996




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